Por Rodrigo Scaglioni
Nos últimos dois meses decisão proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho, por meio de arguição de inconstitucionalidade da Lei da Desindexação da Economia (lei 8.177/91), nos autos da reclamação trabalhista 0000479-60.2011.5.04.0231, causou extrema insegurança jurídica na seara trabalhista.
O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho entendeu que“por arrastamento deveria ser declarada inconstitucional a expressão “equivalentes à TRD” contida no caput do artigo 39 da Lei nº 8.177/91, que define a TR como índice de atualização monetária dos créditos trabalhistas, por não refletir a efetiva recomposição da perda resultante da inflação.
A decisão proferida pelo TST fora fundamentada no sentido de que a regra de atualização considerada inconstitucional pelo STF também incide sobre os débitos trabalhistas, oriundos de sentença judicial proferidas contra os devedores públicos e privados, por força da citada Lei nº 8.177/91 – e, embora tenha sido proferida no exame de atualização de precatório, não havia fundamento para que fosse mantida a regra de atualização do débito pela TR nas ações trabalhistas que possuem natureza alimentar.
Representa dizer que o TST observou que o Supremo Tribunal Federal (STF), em quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 4357, 4372, 4400 e 4425), declarou inconstitucional a expressão "índice oficial da remuneração básica da caderneta de poupança", disposta no parágrafo 12 do artigo 100º da Constituição Federal, e afastou a aplicação da Taxa Referencial (TR). Destacou o TST, em sua decisão, que segundo o STF, a atualização monetária dos créditos é direito do credor e deve refletir a exata recomposição do poder aquisitivo decorrente da inflação do período, sob pena de violar o direito fundamental de propriedade, a coisa julgada e o postulado da proporcionalidade, além da eficácia e efetividade do título judicial e a vedação ao enriquecimento ilícito do devedor.
Esse desdobramento da decisão do STF na decisão proferida pelo TST, chama-se"declaração de inconstitucionalidade por arrastamento" (ou por atração, consequência, etc.), que ocorre quando a declaração de inconstitucionalidade de uma norma se estende a outros dispositivos conexos ou interdependentes.
O Pleno do TST, dessa forma, decidiu adotar a técnica de interpretação conforme a Constituição para o restante do caput do artigo 39 da Lei 8.177/91, que garante a atualização monetária dos créditos trabalhistas, e extinguiu apenas a expressão considerada contrária à Constituição Federal e assegurou o direito ao índice que reflita a variação integral da inflação.
Ainda, os Ministros do TST determinaram a seguinte modulação:
Os efeitos da decisão deverão prevalecer a partir de 30 de junho de 2009 (data em que entrou em vigor o dispositivo declarado inconstitucional pelo STF artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, introduzido pela Lei 11.960/2009);
Aplica-se a todos os casos em fase de execução, a partir de junho de 2009, desde que não tenha ocorrido pagamento, total ou parcial (parcelamento ou acordo em vigência);
Não se aplica às situações jurídicas consolidadas, resultantes de pagamentos já efetuados nos processos judiciais, em andamento ou extintos, em virtude dos quais foi adimplida e extinta a obrigação, ainda que parcialmente.
Os efeitos da decisão proferida no TST, com a expedição de ofício a CSJT para retificação da tabela de índice de correção monetária dos débitos trabalhistas, conferindo, portanto, verdadeira decisão erga omnes com efeitos ex tunc, representaria acréscimo aproximado de 30% nos valores de praticamente todas as execuções em trâmite perante a Justiça Especializada.
Diante da referida decisão a FENABAN ajuizou reclamação 22.012, onde em sede de Medida Cautelar pleiteou a concessão de liminar para:
suspender integralmente a eficácia da r. decisão reclamada, suspendendo-se a aplicação erga omnes e ordenando-se o pronto recolhimento da tabela de correção expedida pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho;
suspender ao menos a eficácia da decisão na parte em que modulou os seus efeitos, que devem retroagir a junho de 2009, observando-se a data da publicação do acórdão, isto é, 14.08.2015;
suspender ao menos a eficácia da decisão na parte em que ordenou a sua aplicação a todas as execuções em curso, especialmente aquelas em que há coisa julgada prevendo a correção monetária nos termos da Lei 8.177/91;
suspender ao menos a eficácia da decisão no capítulo em que fixou como novo índice de correção monetária o IPCAE, tendo em vista a ausência de base legal para a fixação de índice diferente do previsto na Lei n. 8.177/91.
O STF, em decisão monocrática do Ministro Dias Toffoli, concedeu a liminar pretendida, por entender presentes o Fumus boni iuris e o Periculum in mora.
Segundo o Ministro Dias Toffoli, o fato de a sistemática processual na esfera trabalhista exigir, para o acesso da via extraordinária, o esgotamento da instância perante o Tribunal Superior do Trabalho, não transfere ao órgão superior dessa especializada a competência exclusiva do STF para apreciar a existência de repercussão geral de matéria constitucional, bem como não autoriza o TST a conferir efeito prospectivo a seu pronunciamento de mérito em tema constitucional ainda não decidido pelo STF.
Destacou na decisão que não procedia a conclusão do TST de que a declaração de inconstitucionalidade da expressão “equivalentes à TRD” contida no caput do art. 39 da Lei 8.177/91 ocorreu “por arrastamento” da decisão do STF nos autos das ADIs 4.357/DF e 4.425/DF, vez que a declaração de inconstitucionalidade por arrastamento alcança dispositivo cuja eficácia normativa dependa da norma objeto da declaração de inconstitucionalidade, ou seja, as ADIs citadas tiveram como objeto a sistemática de pagamento de precatórios introduzida pela EC 52/09, onde, o limite objetivo da declaração de inconstitucionalidade “por arrastamento” do art. 1º-F da Lei 9.494/97 alcançou “ao intervalo de tempo compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo pagamento”, jamais teria alcançado o objeto da decisão do TST, no caso, a expressão “equivalentes à TRD” contida no caput do art. 39 da Lei 8.177/91.
A conclusão lógica é no sentido de que, por não ter havido apreciação de constitucionalidade ou inconstitucionalidade do caput do artigo 39 da Lei 8.177/91 sido submetida à sistemática da repercussão geral ou em sede de controle concentrado, ao contrário do que fora entendido pelo TST, a decisão reclamada usurpou a competência do STF para decidir, em última instância, controvérsia com fundamento na Constituição Federal.
E, referente ao efeito prospectivo da decisão do TST, fundamentou o Ministro do STF que a retificação da tabela de atualização monetária do CSJT foi além do que era possível, pois não se restringiu ao caso concreto e alcançou todas as execuções da Justiça do Trabalho, o que esvaziou a força normativa da expressão “equivalente à TRD”.
Reforçou, na decisão, que a tabela implementa o IPCA-E como índice de atualização monetária de débitos em hipóteses diversas da que foi submetida à análise desta Suprema Corte nas ADI nºs 4.357/DF e 4.425/DF – dívida da Fazenda Pública no período entre a inscrição do débito em precatório e seu efetivo pagamento.
Por tais fundamentos o STF, em sede liminar, determinou a suspensão dos efeitos da decisão do TST e da “tabela única” editada pelo CSJT.
A consequência lógica dessa decisão é no sentido de que, enquanto estiver produzindo efeitos a decisão liminar, concedida pelo STF, todas as execuções trabalhistas deverão observar, quanto ao índice de atualização monetária, a TRD.
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*Rodrigo Scaglioni é advogado do escritório CMMM – Carmona Maya, Martins e Medeiros Advogados.