A Lei Maria da Penha (lei 11.340/06) representou, sem sombra de dúvidas, um grande avanço no combate à violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral, contra a mulher, no âmbito doméstico ou familiar.
Ainda assim, os dados estatísticos relativos à violência sofrida, todos os dias, pelas mulheres, são alarmantes. Em pesquisa realizada no ano de 2017, pelo Datafolha, ficou constatado que, a cada hora, 503 mulheres brasileiras são vítimas de agressões físicas.
Visando combater este fato, verificada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, o juiz poderá aplicar, ao agressor, medidas protetivas de urgência, a fim de preservar a integridade física e psicológica da mulher violentada. Essas medidas protetivas consistem, por exemplo, em afastamento do agressor do lar, domicílio ou local de convivência com a mulher violentada; proibição de aproximação da mulher violentada e de seus familiares, fixando um limite mínimo de distância entre estes e o agressor; proibição de contato com a mulher violentada por qualquer meio de comunicação; dentre outras medidas previstas na lei.
O principal objetivo de se tomar tais providências, é justamente resguardar a mulher violentada e sua família, de maneira que se possa conter o agressor, fazendo cessar de imediato a situação de violência, a fim de se evitar um mal maior. Estas medidas fazem parte de todo um sistema de proteção estabelecido pela Lei Maria da Penha, que busca dar efetividade aos direitos humanos e à devida proteção das mulheres.
Interessante rememorar que, logo após a entrada em vigor da Lei Maria da Penha, iniciou-se uma grande discussão, principalmente nos nossos Tribunais, sobre as consequências do descumprimento das medidas protetivas de urgência: se poderiam caracterizar (ou não) crime de desobediência.
O STJ pacificou seu entendimento no sentido de que o descumprimento das medidas protetivas da Lei Maria da Penha não poderia caracterizar crime de desobediência, pois a própria lei já estabelecia, na hipótese de descumprimento, sanções específicas de natureza civil (multa, prevista no §4º do artigo 22 da Lei Maria da Penha), de natureza administrativa (requisição de auxílio de força policial, prevista no §3º do artigo 22 da Lei Maria da Penha), e, também, de natureza penal (decretação de prisão preventiva, prevista no artigo 313, III, do CPP).
Embora pacificado pelo STJ, tal entendimento não fez com que outros Tribunais pelo país afora deixassem de considerar crime de desobediência, o descumprimento de medidas protetivas, aplicando o artigo 330 do CP para estes casos.
A divergência apresentada e a ausência de norma específica que criminalizasse o descumprimento das medidas protetivas da Lei Maria da Penha, vinham acarretando enorme prejuízo ao sistema de proteção objetivado pela própria lei.
Assim, para solucionar a questão, a partir de 04 de abril de 2018, entrou em vigor uma lei que criminaliza especificamente o descumprimento das medidas protetivas de urgência: a lei 13.641/18. Esta nova norma insere na Lei Maria da Penha o artigo 24-A, que prevê pena de detenção de três meses a dois anos, sem exclusão da aplicação de outras sanções cabíveis, para quem descumprir decisão judicial que impõe medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha. Trata-se de crime próprio, só podendo ser cometido por aqueles que estão obrigados a respeitar as medidas protetivas decretadas.
Importante ressaltar que, nos casos de prisão em flagrante por crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência, somente o juiz poderá conceder fiança. Ademais, comete este crime aquele que descumprir a decisão judicial que impõe medidas protetivas da Lei Maria da Penha, independentemente de terem sido impostas por juiz cível ou criminal.
Esta nova lei é, portanto, uma resposta do legislador à lacuna legislativa e à celeuma que se apresentava até então, impedindo a uniformização das decisões nos Tribunais, bem como a devida punição daqueles que descumpriam as medidas protetivas de urgência da Lei Maria da Penha.
Nota-se, portanto, que a violência contra a mulher é uma realidade constante. As estatísticas não mentem. É fato que o descumprimento de medidas protetivas de urgência não poderia ficar impune, pois suas consequências podem ser fatais. Agora, além das sanções de natureza civil (multa), administrativa (força policial) e penal (prisão preventiva), existe uma figura criminal específica que garante a punição do agressor com pena de prisão. Mais uma acertada iniciativa de proteção às mulheres, que merece aplausos.
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*Adriana Filizzola D’Urso é advogada do escritório D'Urso e Borges Advogados Associados.